Letras UFABC

01/09/2010

Dos Livros que Li: 1 – “Quarto de Despejo”

Filed under: Dos Livros que Li — Letras UFABC @ 12:20
Tags: , , , , , , , , , , , , , ,

Olá! Como vão? Vou começar essa série de postagens chamada ‘Dos Livros Que Li’. Aqui contaremos um pouco sobre os livros que já lemos; sinopse, impressões, avaliações, curiosidades.

Livro: QUARTO DE DESPEJO – Carolina Maria de Jesus


“Quarto de Despejo” – Carolina Maria de Jesus


Informações:

  • Editora: ATICA
  • Ano Edição: 2007
  • Número Edição: 9
  • Coleção/Série: SINAL ABER
  • Qtde. Páginas: 192
  • Idiomas: Português
  • Dimensões (LXAXP): 13,5 X 20,5 cm
* Retirado do site da Fnac: http://migre.me/1bntr

Sinopse:

Quarto de Despejo é um diário. Escrito dia a dia. Caderno e mais caderno cheios pela letra de uma mulher. Recheados do cotidiano autêntico, vivido. A luta pela sobrevivência como ela é, em todos os “quartos de despejo” do mundo, à margem das grandes cidades. Quarto de Despejo é mais que isso. É reportagem, é romance, é história de um grupo humano em certa época do mundo. É a voz do povo, patética, lírica, sentimental, forte e inesquecível.
O duro cotidiano dos favelados ganha uma dimensão universal, na linguagem simples do diário de uma catadora de lixo.

* Retirado do Skob: http://www.skoob.com.br/livro/7123

Eu o li quando tinha uns 12/13 anos, uma leitura isenta de obrigações escolares. Pelo visto li no tempo certo, já que o livro é considerado literatura infanto/juvenil.

É um livro do estilo lição de vida, que realmente deveria ser lido por pessoas arrogantes, esnobes, egoístas… Principalmente da faixa dos 10 – 15 anos.

Baseado em fatos reais, o livro que impressiona e nos põe a pensar sobre a vida e sobre a situação dos pobres no Brasil. A autora, Carolina, catadora de lixo, três filhos, moradora da favela do Canindé (São Paulo – SP), escreve esse livro dia a dia, portanto não é um livro de memórias, e sim um diário. Narrando sua vida, ela acaba por retratar a realidade de outros muitos brasileiros que passavam pelas mesmas dificuldades que ela.

É uma vida de dificuldades em todos os sentidos, ainda mais naquela época em que havia (mais acentuadamente) problemas estruturais, como os de saneamento básico. Carolina foi uma batalhadora que literalmente fez história, não se contentando e ainda lançando outros livros. Quarto de Despejo foi lançado na década de 60 e o mais triste é constatarmos que 50 anos depois ainda é comum encontrarmos na sociedade várias pessoas com problemas tão parecidos com aqueles de outros tempos.


Fica então essa dica de leitura pra você! Já leu? Quer ler? Comente!

Convidamos você, leitor, a participar também! Basta nos escrever no e-mail: letrasufabc@gmail.com com seus dados e seu texto sobre o(s) livro(s) lido(s).

Ana Carolina

Letras – UFABC

30/03/2010

Barbas brancas, orelhas compridas – por Ana Carolina B. Silva

Filed under: Escritores da UFABC — Letras UFABC @ 03:00
Tags: , , , , , , , ,

No 4º Encontro, pudemos também ler um conto de Ana Carolina B. Silva:  Barbas brancas, orelhas compridas.

Ana Carolina

Leia na íntegra.

BARBAS BRANCAS, ORELHAS COMPRIDAS

Por Ana Carolina Barbosa Silva

“Querido Papai Noel, muito obrigado pela escada que o senhor me mandou no Natal passado! Só não precisava tê-la realmente colocado dentro da minha meia, que por acaso eu havia acabado de comprar… Nesse ano, assim como nos outros, eu fiz muitas coisas boas: não joguei lixo nas ruas, participei ativamente como voluntário de uma organização que cuida de iguanas em extinção, além de não ter comido em restaurantes do tipo fast-food nem sequer uma vez. Espero que o senhor e Mamãe Noel tenham tido um ano feliz, e adoraria ganhar uma escada maior neste Natal, já que o meu pé de feijão cresceu consideravelmente nos últimos meses. Um ótimo final de ano para vocês!

Atenciosamente, João.

PS: Têm tido notícias dos Três Porquinhos? Da última vez que os vi, eles estavam numa conferência da ONU, protestando contra os frigoríficos de carne suína e querendo a proibição da preparação da Feijoada em todo o mundo. Bem, se o senhor os vir, diga que mandei lembranças.”

Papai Noel estava, com ajuda dos duendes, trabalhando a todo vapor a fim de conseguir ler as diversas cartas e providenciar os presentes de Natal das crianças de todo o mundo. Não era um trabalho fácil, muitas crianças indecisas mandavam listas enormes que continham itens que variavam de bonecas e carrinhos a celulares e computadores. Sua fábrica de presentes já não estava mais dando conta de tanta produção, pois, principalmente os países pobres, não controlam a natalidade, e com quatorze anos de idade muitas meninas já são mães; em contrapartida a isso, na África, muitas crianças nem chegavam aos quatorze anos de idade, pois morriam de fome, ou desnutrição, ou AIDS, ou todos juntos. Ele estava até pensando em se candidatar à presidência do Brasil, assim talvez conseguisse diminuir a natalidade, e a corrupção também, prometendo cassar o mandato daqueles que não se comportassem bem durante todo o ano; mas ele não teria tempo para as crianças, que comparadas aos corruptos, davam bem menos trabalho, então desistiu da idéia de se tornar presidente.

“Papai Noel fofinho, muito obrigada pelo xampu anti-queda que o senhor me mandou no último Natal! Não sei o que seria de mim se minhas tranças continuassem a se desfazer daquele jeito. Espero que o senhor tenha recebido todos os relatórios das minhas atividades durante esse ano, o senhor sabe, não tenho muito o que fazer o dia inteiro trancada nessa torre, pensei que os relatórios poderiam lhes ser úteis, poupando o seu trabalho de investigação quase secreta sobre minha vida. Como você pôde constatar, eu realizei ótimas ações esse ano: não dormi com os cabelos molhados; não atirei pedras em pombos; não tomei banho todos os dias, economizando a água do planeta; eu também não fiz chamadas de longa distância ao telefone, enfraquecendo o poder das companhias telefônicas. Não fiz mais coisas porque aquela bruxa não me deixa sair dessa masmorra. Esse ano eu gostaria muito de ganhar um binóculo, assim poderia observar um pouco mais do mundo daqui de cima. Quando quiser aparecer por aqui um dia desses, é só gritar que eu te jogo as minhas tranças.

Um beijo na pontinha do nariz, Rapunzel. ”

Na sala de estar, ornada por um televisor de muitas polegadas, ar condicionado e quadros dos mais diversos pintores e épocas, Papai Noel tomava o chá da tarde, servido por sua querida e velha esposa.

— Rou, rou, rou! Estou que não agüento mais minhas pernas – lastimou Papai Noel. – Esse maldito reumatismo está me consumindo aos poucos…

— Eu já te disse para fazer uma visita ao Mágico de Oz, ele não te negará uma ajudinha. Te falei que semana passada eu fui lá para dar uma esticada no rosto? Menino, o moço é mais danado que o Ivo Pitangui! – disse Mamãe Noel com notável entusiasmo.

— Bem que eu reparei que você não está conseguindo sorrir direito… – cochichou o Papai Noel sem que a Mamãe Noel ouvisse.

— Meu bem, hoje chegou mais um monte de cartas. Eu sei que não devia, mas tomei a liberdade de abrir algumas, é que eu vi os nomes e não me contive. A Chapeuzinho Vermelho disse que estava morrendo de saudades e que agora que sua Vovozinha havia se mudado para longe, ela queria ganhar uma bicicleta, já que ainda não tem idade para dirigir.

Papai Noel não estava mais ouvindo o que a Mamãe Noel lhe dizia. Estava preocupado com a produção da fábrica. Tantos brinquedos diferentes, tão pouco tempo para serem fabricados, afinal, o Natal já estava por vir. Naquele momento sentiu inveja do Coelhinho da Páscoa. “Uma produção em massa de ovos de chocolate deve ser menos trabalhoso de manter”. Eis que lhe surgiu uma idéia.

– – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – –

Enquanto isso, na toca do Coelhinho da Páscoa, um rock antigo tocava na rádio:

“Era um coelhinho de dentinhos tão branquinhos, bem pequeninho…”

— Desliga esse rádio! Não se pode ter um minuto de silêncio nessa casa! Eu vou desaparecer nesse mundo, viver numa comunidade Hare Krishna na Índia. Está tudo errado! Só eu não ganho na loteria, só eu tenho que dar sinal para o ônibus parar, só eu não pago meia no cinema! Tô cansado! – gritou o Coelhinho da Páscoa com sua esposa, enquanto organizava o estoque de ovos de chocolate branco.

— Calma, meu bem! Já desliguei, mas não precisa ficar nervoso por uma simples musiquinha!

— Se fosse só esse o problema… Eu estou cansado de tudo! Não agüento mais viver nessa vida. Chocolate, chocolate, chocolate, chocolate! Eu estou ficando louco!

A Senhora Coelhinho da Páscoa compadeceu-se do marido e foi tentar arrumar uma solução para o problema que o afligia. Há muitos anos ele estava naquela rotina; todo ano tinha que especular o gosto das crianças por chocolate ao leite, branco, crocante, ou outro e, depois de fabricá-los, tinha que sair escondendo pelos quintais e casas de todo o mundo. Apesar de ser uma profissão valorizada, era um tanto quanto anônima, só era possível manter contato com seletíssimas pessoas; se algum paparazzi o flagrasse, não teria mais sossego e as crianças descobririam todos os esconderijos dos ovos.

No período da tarde, a Senhora Coelhinho da Páscoa chamou seu marido para assistir a um pouco de TV.

— Eu tenho mais o que fazer! Você acha que eu tenho cara de quem quer assistir à novela mexicana numa hora dessas? Vou começar a esconder os ovos amanhã, tenho que preparar minha bagagem! Por falar nisso, você já fez meu bolo de maçã?

— Calma, eu prometo que você não vai se arrepender de assistir à televisão um instante!

Contrariado e arisco, o Coelhinho da Páscoa cedeu à insistência da mulher.

A Secretaria de Segurança acaba de confirmar mais um ataque do PCC a um ônibus no centro de São Paulo, uma pessoa ficou gravemente ferida e foi levada para o hospital. É um absurdo a questão da segurança nessa cidade! Eu fico indignada! Mas agora no nosso programa, uma aula de artesanato com Marina Soap. Hoje a Marina vai nos ensinar a fazer aquele sabonete em forma de sol. Boa tarde Marina!

Boa tarde, é um prazer estar aqui novamente, Tátia.

Atenção coleguinha, pegue papel e caneta e anote os ingredientes da nossa dica artesanal de hoje.”

No decorrer da receita, o Coelhinho da Páscoa ficou atento a todos os detalhes. Enquanto isso, sua esposa anotava os ingredientes e o modo de fazer. Após meia hora, quando a receita já havia acabado, o telefone tocou e o Coelhinho atendeu:

— Pois não.

— Rou, rou, rou! Olá Coelhinho, adivinha quem está falando?

— A Fada dos Dentes?

— Não, sou eu, o Papai Noel!

— Ah, nem imaginava! Como vai?

— Quase tudo bem, você sabe, essa velhice dificulta um pouco as coisas, mas e você, como vai?

— Tentando resolver os problemas. Mas está tudo indo bem. No mês passado nasceram meus dois gêmeos! E a menina! E tem um que eu ainda não sei ao certo o que é, mas enfim, a família aumentou!

— Rou! Que maravilha!

— Mas me diga, por que ligou? – indagou o Coelhinho.

— Ah, a questão é complicada, tenho uma proposta para te fazer. Se você não quiser aceitar, eu entendo, não é algo fácil de aceitar, quando a gente se apega a alguma coisa é realmente difícil de largar, mas às vezes é preciso dar um novo rumo a nossas vidas e os caminhos são diversos uma vez que…

— Está bem! Qual é a proposta? – Falou o Coelhinho impaciente.

— Eu quero comprar sua fábrica de chocolates.

Um momento de silêncio pairou no ar, Papai Noel do outro lado da linha cerrou os dentes apreensivo.

— Coelhinho? Você ainda está aí? Eu vou entender se você não quiser vendê-la. Assim… os presentes que eu te dei quando você ainda era uma criança são meras lembranças, você não me deve nada por aquilo.

— Tudo bem eu vou te vender a fábrica. Mas primeiro o senhor terá que me indicar uma fábrica de sabonetes para eu comprar.

— Não sabia que você tomava tanto banho assim…

— Não é isso. Já que vou vender a fábrica de chocolates, tenho que substituir os ovos das crianças por alguma outra coisa e, bem, estava agora mesmo assistindo a um programa de televisão e passou essa receita, achei interessantíssimo.

Achar a fábrica para o Coelhinho comprar foi tarefa fácil para o velho Noel, que assim, comprou a fábrica do Coelhinho. O Coelhinho passou a produzir sabonetes de todos os tipos, em forma de sol, de lua, de flor, de ovo, de coelho e até de Papai Noel. As crianças não se acostumaram a ganhar sabonetes na Páscoa, algumas ficavam confusas e os comiam, principalmente aqueles com aroma de chocolate.

“Era um coelhinho de dentinhos tão branquinhos, bem pequeninho…”

— Desliga esse rádio! Eu quero ouvir a receita na televisão! Hoje vai passar uma receita especial de sabonete comestível!

— Calma querido!

– – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – – –

Papai Noel finalmente foi visitar o Mágico de Oz, esperto, aproveitou para tirar aquela gordurinha a mais da barriga. Seus problemas foram quase resolvidos. Agora o único presente que dava às crianças no Natal era chocolate. A princípio, as crianças ficaram aborrecidas com o presente, pois queriam mais, queriam carrinhos de controle remoto, celulares, videogames, computadores. Então, para acalmar os ânimos, ele teve que fazer uma promoção: a cada ano colocava, aleatoriamente, cinco cupons dentro dos chocolates; as crianças que os achassem, poderiam visitar por um dia a fantástica fábrica de chocolates do Papai Noel. Era uma festa.

Querido Papai Noel, essa carta seria na verdade para reivindicar a escada maior que eu te pedi e que o senhor não mandou. Mas, por outro lado, o senhor me mandou um maravilhoso chocolate com pedaços de nozes e, ainda por cima, eu achei o cupom da sorte e irei te visitar no dia combinado! Um dia desses eu parei para refletir: como chocolate é gostoso! Não consigo mais parar de comer! Tomei uma decisão drástica: derrubei meu pé de feijão, e construí um enorme pé de cacau no lugar. Agora virei um empreendedor do ramo chocolático. Comercializo com todos os meus amigos da escola. Só tenho a te agradecer. Obrigado pelo magnífico presente.

Atenciosamente, João.

PS: Os Três Porquinhos me ligaram na semana passada. Eles foram para a China, se juntar aos cachorros na Passeata Internacional pelos Cães e Porcos. Eles se mudarão em breve para suas casas próprias, e pediram que você deixasse os chocolates sempre na casa de tijolos, não entendi muito bem por quê, mas deve ser superstição boba. ”

Letras – UFABC

Blog no WordPress.com.